O sábado Robe e sua banda atuaram no Muelle de Batería de A Coruña para uns quantos milhares de almas que nos reunimos ante sua chamada à oração. Foi um prazer ser testemunha da evolução deste músico de Plasencia, sobretudo porque tanto ele como suas canções (e sobretudo as de Extremoduro, algumas das quais tocaram com mais de 30 anos sobre os palcos, como é o caso de Tu corazón ou esse final de liturgia vibrante e atemporal que é Ama, ama, ama y ensancha el alma) envelhecem como os bons vinhos.
Robe Iniesta não precisa de muito artifício para chegar ao coração. Acompanhado no palco por sua grande banda, músicos com formação clássica, que unidos à potência avassaladora desse rock transgressivo que se forjou em Extremoduro, não param de se mover até lugares sonoros muito bem arredondados, com adereços que levam ao êxtase graças ao violino, saxofone, clarinete, a alguns solos de piano ou bateria que penetram nas entranhas e à voz que Lorenzo González crava diretamente no centro do peito de quem se atreve a se abrir à experiência.
Robe é também poeta, ou escreve poesia, ou faz o que talvez seja mais importante: praticá-la, e isso se nota em suas letras. Sua mera presença cênica, aparentemente austera, emana um estar no mundo decidido, comprometido com o tempo pelo qual se desliza e também até os ovos do que há. Mas o seu é um cansaço cheio de dignidade. Às vezes se rebela Contra todos e outras se posiciona muito a favor dos sinais mais sensíveis da nossa humanidade. Nada disso parece contraditório, mas sim um sintoma inequívoco de pisar o chão.
Ele se acompanha de Álvaro Rodríguez (teclados, piano), Carlitos Pérez (violino), Woody Amores (guitarra), David Lerman (baixo, saxofone, clarinete), Alber Fuentes (bateria) e Lorenzo González (vocal e guitarra em algum momento pontual), um combo que roda em perfeita sincronia, armando texturas sonoras desde a delicadeza de temas como Puntos suspensivos ou essa delícia que é o Cuarto movimiento: La realidad, do incrível álbum que gravou com Extremoduro: La ley innata… até a eletricidade cheia de força da recente Haz que tiemble el suelo.
Transitaram três horas de concerto dividido em duas partes, a primeira com certo espaço para a reflexão, em um percurso algo introspectivo e que começou com o tema Destrozares. Saíram com tudo no segundo tempo, com um solo de bateria que foi o prelúdio de uma descarga de chicotadas, praticamente sem trégua, na qual golpe a golpe acabaram de engatar as canções que restavam do novo disco. O apresentaram praticamente inteiro e soou vigoroso e com uma força que ultrapassa claramente a gravação, sendo muito celebrado pelo público. O entrelaçaram com temas anteriores como Poema sobrecogido, Mayéutica e sua Coda Feliz que nos deixa sempre à beira do delírio. Quis chegar ao final em apoteose coletiva com La vereda de la puerta de atrás. E voltou aos bises um pouco como começou, com a humildade de quem sabe que está aqui para cair e voltar a cair e com um pouco de sorte poder se levantar novamente para travar uma batalha, de alguma forma, perdida de antemão: Nada que perder.
Obrigado Robe, por tanta companhia nesta viagem linda, embora às vezes custe resgatar o brilho entre tanta merda.