No que toca a grandes concertos de metal em Portugal, o dia 26 de Fevereiro de 2025 ficará eternamente marcado na memória dos fãs de música extrema e na história da Prime Artists e do Sagres Campo Pequeno. Trivium e Bullet For My Valentine, acompanhados pelos Suecos Orbit Culture, criaram uma onda de nostalgia musical num Campo Pequeno praticamente esgotado, numa data a meio da semana.

Público na “The Poisoned Ascendancy Tour” no Sagres Campo Pequeno | @the.goldenrush

A primeira grande tour de 2025 a passar por Portugal diz respeito, sem qualquer margem para discussão, a esta mesmo, a “The Poisoned Ascendancy Tour” que junta dois enormes nomes, responsáveis quase pela “criação” de estilos musicais que damos hoje por garantidos. Tal como o próprio Matt Tuck disse a meio da performance “demorou demasiado tempo a juntar os Trivium e os Bullet For My Valentine numa tour, mas mais vale tarde do que nunca“. Concordo que de facto demorou demasiado tempo, mas haveria melhor altura para o fazer se não esta mesmo? A celebração de 20 anos de duas obras como “The Poison” e “Ascendancy“?

E a grandiosidade deste evento é ainda mais destacada quando temos Orbit Culture a abrir as hostilidades. Não deu tempo de aquecer com estes Suecos pois à segunda música já se viu um circle pit potentíssimo como se estivéssemos já a meio da noite. O “rótulo” de “abertura de espetáculo” simplesmente não assenta bem aqui. Foi muito mais do que isso.

Começando então pelo início, ainda bem antes da abertura de portas, filas já se formavam à entrada da porta 1 do Sagres Campo Pequeno à procura de um lugar o mais próximo possível do palco. Assim que as portas abrem às 18h, em 15 minutos o recinto ficou praticamente cheio para assistir à atuação dos Orbit Culture. Esta foi a sua estreia em terras portuguesas e diria que após a receção que tiveram, o seu regresso não estará longínquo. Não sei se a própria banda tinha esta ideia, mas existe uma rede de fãs gigante em Portugal que estava sedenta de uma atuação destes Suecos. A estreia finalmente aconteceu, mas ficamos a ansiar por mais. Um alinhamento de apenas 5 temas não foi suficiente para saciar os fãs.

Às 18h45 em ponto, os Orbit Culture sobem ao palco com o barulho de fundo das palmas e gritos dos fãs. Dezenas e dezenas de t-shirst e sweats da banda Sueca eram visíveis no público, provando que muitos dos presentes neste evento estavam à espera deste concerto.

Chamar a esta atuação “concerto de abertura” é quase um crime. Orbit Culture não deram tempo para qualquer aquecimento. O grupo de Melodic Death com bastante Groove à mistura liderado por Niklas Karlsson apresentou uma maturidade impressionante. Com o seu som cheio de peso, trabalhos de bateria bem construídos, vocais poderosíssimos e uma presença imponente e segura, fizeram muito mais do que aquecer o público. Aquilo que fazem é único, cheio de identidade definida pelos mesmos e é isso que os está a trazer ao topo de forma tão exponencial.

Obviamente não caíram neste alinhamento por acaso. São sentidas influências dos headliners do evento (maioritariamente de Trivium) demonstrando mais uma vez a importância e dimensão que tanto os Americanos como os Galeses têm no mundo da música extrema.

Orbit Culture | @the.goldenrush

A atuação começou com “Descent”, que logo nos primeiros segundos se apresenta como completamente esmagadora. Logo aqui a habilidade do baterista Christopher Wallerstedt se eleva à enésima potência, assim como do vocalista Niklas, e os riffs, esses cheios de peso fazem o resto.

E foi logo no segundo tema, “North Star of Nija“, que se testemunhou o primeiro de muitos circle pits da noite. Mais uma vez, uma prestação vocal incrível com variações entre vozes limpas e berradas que dão uma versatilidade ao tema muito boa. E mais uma vez também, padrões de bateria incrivelmente rápidos e completamente explosivos. Uma completa lufada de ar fresco!

Antes do último tema, uma pequena pausa em toda aquela brutalidade. Niklas aproveita este momento para agradecer ao público por estar ali tão cedo para a sua atuação. Mais uma prova que de “concerto de abertura” não teve nada! É neste momento também que uma bandeira é atirada para o palco vinda do público, bandeira esta com o símbolo dos Orbit Culture combinado com a bandeira portuguesa. Os membros da banda ficaram tocados e até emocionados com este gesto que demonstra mais uma vez a comunidade de fãs fieis que existe por cá!

Para finalizar esta curta mas incrível atuação, o tema escolhido foi “Vultures Of North” e não poderia ser de outra forma. Uma última vez, estes Suecos demonstraram do que são capazes e fizeram tremer o chão, as paredes, o teto e os arredores do Sagres Campo Pequeno. Este tema tem um refrão que merece (e foi!) gritado em uníssono pelo público. E o riff combinado com a bateria rápida fizeram com que o último circle pit fosse ainda mais potente que os anteriores.

Orbit Culture, embora sejam um grupo recentemente formado – 2013 – vieram para ficar e liderar o mundo do metal moderno, não há dúvidas disso. A música, a postura, o sentimento, a vibração, a loucura, está tudo aqui! E por cá, o que posso dizer é que Portugal aguarda pelo regresso com um alinhamento mais longo.

Orbit Culture | @the.goldenrush

Setlist – Orbit Culture: 1 – Descent | 2 – North Star of Nija | 3 – From the Inside | 4 – While We Serve | 5 – Vultures Of The North

Quando a intro de Bullet For My Valentine começa às 19h45, uma nuvem nostálgica avassaladora inunda o recinto. Estávamos prestes a viajar no tempo 20 anos durante quase 1 hora. Ainda antes da música começar, somos transportados para os anos 2000 através das imagens que passavam no fundo do palco dos membros da banda em 2004, momento em que se estrearam no Download Festival dando o salto exponencial para a ribalta do metal britânico e não só. Confesso que fiquei em pele de galinha. É emocionante ver tais imagens porque no momento em que foram gravadas, os Bullet For My Valentine e até mesmo o público não faziam a menor ideia do impacto que “The Poison” iria ter no mundo da música extrema daí em diante. Arrisco-me a dizer que o álbum definiu um estilo – o Metalcore como o conhecemos atualmente só existe porque este álbum foi criado.

A nostalgia já estava bem instalada no recinto quando a Intro de “The Poison” se ouve. Logo de seguida o quarteto sobe ao palco e os berros do público devem ter-se ouvido a alguns quilómetros de distância do recinto. O alinhamento respeitou a ordem da masterpiece que é este álbum, e portanto o primeiro tema a ser ouvido foi “Her Voice Resides“. “Obrigado por não se esquecerem de nós” foram algumas das palavras ditas por Matt, e logo no primeiro tema a prova estava dada com tantas vozes a se ouvirem por parte do público enquanto cantavam do início ao fim a letra da música. É simplesmente incrível, 20 anos se passaram e a vividez que existia neste e nos restantes temas tocados fazem com que pareça que a música foi escrita há meses. Mas é compreensível, este álbum marcou e continua a marcar milhares e milhares de pessoas independentemente da geração de que estejamos a falar.

E logo a seguir a “4 Words (To Choke Upon)” e os seus riffs estrondosos e os frequentes “look at me now” cantados e berrados pelas milhares de pessoas presentes, veio O TEMA. Aquele que 100% do público sabia a letra de trás para a frente e estava mortinho por cantar em conjunto com os próprios Bullet For My Valentine. Este tema mereceu uma introdução acústica especial onde quase não foi preciso Matt cantar. Apenas a sua guitarra e a voz do público foram precisas para criar um momento marcante ao som da letra inicial de “Tears Don’t Fall“. Logo de seguida o instrumental entra e viveram-se aqui 6 minutos de uma gigante intensidade e nostalgia. Registou-se ali um momento simplesmente inesquecível. Só quem lá estava saberá do que estou a falar pois é impossível descrever por simples palavras.

Bullet For My Valentine | @the.goldenrush

E diria que daqui em diante, o crowdsurfing começou e nunca mais parou. Agradecimentos aqui à equipa de segurança por ter apanhado (a maioria) dos crowdsurfers e pelo excelente trabalho que realizaram. Não foi nada fácil estar daquele lado durante este concerto…

Seguiram-se os temas do álbum, como “Suffocating Under Words Of Sorrow (What Can I Do)” e “Hit The Floor” que merece aqui ser destacada pois foi desenterrada do baú, tendo sido a última vez tocada, antes desta tour, em 2016. Esta faixa permitiu uma demonstração extra da precisão técnica da banda, enquanto Michael Paget elevou a fasquia com solos absolutamente esmagadores.

All These Things I Hate (Revolve Around Me)” é mais uma daquelas faixas de levar o público à loucura. A energia era quase palpável! Com a introdução leve deste tema, mais uma vez o coro do público permite ouvir-se tornando o momento mágico. “Hand Of Blood” e “Room 409” foram os temas a serem tocados antes da faixa que deu nome ao mítico álbum – “The Poison“.

Em vários destes temas, Jamie Mathias, apresentou-se como autor de várias das vocalizações mais agressivas, algo que merece ser aqui mencionado pois, na minha opinião, garantiu uma evolução notável na banda, aumentando a versatilidade do grupo. E deixem-me dizer-vos que esteve bem à altura do desafio.

Bullet For My Valentine | @the.goldenrush

Já a chegar à parte final do álbum, “10 Years Today“, “Cries in Vain” e “The End” foram os protagonistas do final desta viagem aos anos 2000. Mas não nos ficamos por aqui, após uma pequena ausência para acalmar um pouco os ânimos, dois temas extra foram tocados e deixem-me dizer-vos que foram tão bem recebidos quanto os anteriores, mesmo sendo eles de outras eras dos Bullet. “Knives” (2021) e “Waking the Demon” (2008) permitiram-nos voar para outras épocas da banda. Estes dois temas em particular apresentam hinos que são a imagem de marca dos Galeses e permitiram esgotar os restinhos de energia que ainda existiam no público.

E assim esta viagem no tempo com os enormes Bullet For My Valentine termina. Hoje, mais de duas décadas depois do lançamento de “The Poison“, esta obra continua bem viva na mente dos fãs. Continuam também a levar arenas e recintos à loucura, com o seu líder Matt Tuck sempre muito carismático, mas agora com uma confiança ainda mais notória, resultado de mais 20 anos de estrada. E não, Portugal nunca se esquecerá dos Bullet For My Valentine, por isso tudo o que Portugal pede é que os Bullet também não se esqueçam de Portugal. Já estamos ansiosos pelo regresso!

Bullet For My Valentine | @the.goldenrush

Setlist – Bullet For My Valentine: 1 – Intro | 2 – Her Voice Resides | 3 – 4 Words (To Choke Upon) | 4 – Tears Don’t Fall| 5 – Suffocating Under Words of Sorrow (What Can I Do) | 6- Hit the Floor | 7 – All These Things I Hate (Revolve Around Me) | 8 – Hand of Blood | 9 – Room 409 | 10 – The Poison | 11 – 10 Years Today | 12 – Cries in Vain | 13 – The End | ENCORE: 14 – Knives | 15 – Waking The Demon

Seguiram-se 30 minutos que permitiram o público repor as energias que já tinham sido completamente esgotadas. Mas tal como Matt Tuck disse durante a atuação “nós podemos estar cansados de atuar todos os dias durante várias semanas, mas assim que chegamos aqui e vemos esta energia todo o cansaço parece desaparecer“. Isto também é sentido do lado do público: não importa de onde vimos, os quilómetros que fazemos para chegar ali, o cansaço acumulado e as cordas vocais já bem sacrificadas. Quando estamos perante bandas com a postura que Orbit Culture, Bullet For My Valentine e a que viria a seguir Trivium, tudo passa para segundo plano. A energia que as bandas demonstraram e a vontade de estar ali foi tão grande e isso tem um enorme impacto no público.

Eram 21h40 quando Trivium subiram ao palco. E enquanto os alinhamentos de Orbit Culture e Bullet For My Valentine foram de encontro àquilo que já era esperado, especialmente para os mais ansiosos que foram coscuvilhar online os alinhamentos em concertos anteriores, o mesmo não se pode dizer de Trivium. Portugal tem claramente um lugar especial no coração destes americanos… Mas já lá vamos.

A abordagem dos Trivium foi de longe magistral. A forma descontraída mas sempre profissional com que encararam o concerto fez sentir que éramos todos família e que não haviam quaisquer quilômetros a separar-nos geograficamente. Matt Heafy é um frontman absolutamente carismático, sempre a brincar com o público e com bastantes toques bem perceptíveis da língua portuguesa. Todos estes elementos fizeram-nos sentir que não havia qualquer distanciamento entre público e banda e os fãs adoram isso.

Tal como prometido, o álbum “Ascendancy” foi aqui o protagonista principal, e a nostalgia foi mais uma vez instalada no Campo Pequeno. A festa começou com o tema introdutório do álbum “The End of Everything” e esta melodia que durou pouco mais de um minuto foi o suficiente para instalar uma ansiedade enorme (saudável) no público para o que viria seguir. E mais uma vez, respeitando o alinhamento do álbum, “Rain” é o primeiro tema a ser interpretado pelos enormes Trivium. Faixa que começa com um riff brutalíssimo e uma rapidez abismal, mas que rapidamente passa para um refrão bem melódico e cantável. Algo que senti logo no primeiro vocal de Matt é que a cada concerto dado, parece estar melhor e melhor em termos vocais. Quando parece que já está no topo, na aparição seguinte consegue sempre surpreender. É impressionante!

Trivium | @the.goldenrush

Seguiu-se “Pull Harder On The Strings Of Your Martyr” e “Drowned And Torn Asunder“. Em ambas as músicas, aquilo que já tinha sido bem visível em Bullet For My Valentine, foi também claro aqui: estas faixas podem ter 20 anos, mas o público lembra-se delas como se tivessem sido criadas ontem. Mais uma prova de que este álbum continua bem atual, mesmo 20 anos mais tarde.

Antes de passar para o próximo tema, Matt tira o casaco e é notável que está a usar uma t-shirt da seleção nacional portuguesa. Uma vez mais, uma declaração de um carinho especial por Portugal. É aqui que faz uma pausa para evidenciar este mesmo carinho: “Adoro tudo em Portugal, as pessoas, a comida, a cerveja, o vinho, o público!

Ascendancy” entra em ação e de seguida temos o privilégio de assistir a um belo solo de bateria por parte de Alex Bent, enquanto por detrás se ergue um gigante insuflável com imagem que se assemelha ao álbum aqui festejado. Foi um belo momento, no mínimo grandioso!

Trivium | @the.goldenrush

A Gunshot To The Head Of Trepidation” e  “Like Light To The Flies” entram em ação antes do grande momento… Matt chama ao palco um dos grandes amigos da banda que toda a gente ansiava que estivesse aqui presente- o Toy! Toy entra em palco acompanhado de palmas e berros que pareciam infindáveis e os minutos que se seguem são de verdadeira festa. Este dueto inicia-se com “Dying in Your Arms” mas a maior surpresa veio a seguir. Num improviso ousado e atrevido, o Campo Pequeno teve o privilégio de assistir em primeira mão a um tema composto na noite anterior, que representa de certa forma, muito bem a cultura portuguesa.  Apoiada nuns riffs pesados, a boa e velha expressão “pó caralho” foi bem representada nesta pequena música que deu origem talvez ao momento mais engraçado da noite. E claro, faltava uma coisa… “Coração Não Tem Idade” foi o último momento desta colaboração com toda a gente a cantar, a dançar e com os belos dotes de língua portuguesa de Matt a impressionar mais uma vez o público português. Foram grandes momentos que se viveram aqui, de pura diversão, cumplicidade e felicidade. Obrigada Toy e obrigada Trivium! E deverei dizer que não há duas sem três…

Voltamos ao icónico álbum com “The Deceived” e “Suffocating Sight” para mais momentos de intensidade e violência (saudável) no público. Antes de partir para os dois últimos temas do álbum, Matt faz uma partilha pessoal. Este álbum foi criado num momento muito difícil da vida de Matt em que ele lutava contra vários demónios que ainda hoje continua a lutar. Isto demonstra que este álbum continua a estar vivo até aos dias de hoje e tal como Matt, muitos de nós, público, sentimos o mesmo.

Os temas “Departure” e “Declaration” encerram o álbum e esta viagem nostálgica a 2005. Viagem esta que permitiu comprovar que 2005 não está assim tão distante da atualidade em vários sentidos. Na minha humilde opinião, foi um luxo assistir a uma banda mais amadurecida que são os Trivium de agora a interpretar um álbum tão importante para o metalcore atual. Não sei se teremos o privilégio de vivenciar tal experiência novamente e por isso guardo estes momentos com tanto orgulho.

Antes do último tema que encerrará o concerto, Trivium pedem ao público das bancadas para se levantarem e à plateia em pé para se baixar. “Vamos terminar isto em grande” e assim o foi. “In Waves” foi o tema escolhido e foi muito bem recebido. Assim que é gritado o primeiro “in waves” toda a gente dá um salto violento e o ultimo mosh pit da noite é iniciado. Com um refrão que é um verdadeiro hino com uma vibe melódica mais alegre de certa forma, foi o fim perfeito deste concerto.

Trivium | @the.goldenrush

Setlist – Trivium: 1 – The End Of Everything | 2 – Rain | 3 – Pull Harder On The Strings Of Your Martyr | 4 – Drowned And Torn Asunder | 5- Ascendancy | 6 – A Gunshot To The Head Of Trepidation | 7 – Like Light To The Flies | 8 – Dying In Your Arms | 9 – Coração Não Tem Idade (Vou Beijar) | 10 – The Deceived | 11- Suffocating Sight | 12 – Departure | 13 – Declaration | 14- In Waves

A The Poisoned Ascendancy Tour foi muito mais do que uma viagem no tempo. Foi a demonstração de que Trivium e Bullet For My Valentine continuam a pesar muito no mundo do metal, moldaram um estilo que conhecemos hoje e criaram obras que NUNCA serão esquecidas. Para todos os presentes, foi uma noite que certamente ficará para sempre nas suas memórias. Uma experiência única que marcará a história da Prime Artists, do Sagres Campo Pequeno, e os fãs de música extrema.

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