Português:

Trinta minutos de espera entre os carros, as janelas com figuras decapitadas e uma margarida que se recusa a cair do vaso. Centro de Lima, nove da noite: a despedida do coletivo “Ruido y Destroy”.

Quando pego o telefone e me dizem que alteraram o line-up, que vão tocar à meia-noite e que não devo ter pressa para chegar lá, vejo com desinteresse o esforço de aguentar uma viagem de 50 minutos preso entre os seios de uma senhora e as costas de um anônimo.

Não me surpreende o quão desorganizado é um evento: o grande número de estranhos que não pagam entrada, o alto preço da bebida alcoólica ou aqueles que não ensaiaram e decidem improvisar. O que me intriga é que isso ainda existe.

Trinta minutos de espera entre os carros, as janelas com figuras decapitadas e uma margarida que se recusa a cair do vaso. Centro de Lima, nove da noite. O lugar é um mistério: uma porta de metal caída e dentro dela uma abertura por onde você compra o ingresso, entra e respira.

Ruido y Destroy, produtor de concertos punk memoráveis ​​como: Keikino (2021) ou 200 anos de nada (2021), despediu-se dos mais de 60 espectadores que, entre o suor e o excesso, decidiram reunir-se para, mais uma vez; fazer você sentir o rugido de alguma música que um alto-falante mal equalizado poderia expectorar.

Em 2021, um dos produtores (a quem chamaremos de “Cocaine Cowboy”) estava sendo ameaçado por manifestantes do partido político “Perú Libre”. Estes, ao observarem o enorme número de jovens reunidos, decidiram despejá-los. Afastaram os conectores de luz dos músicos, fugiram a qualquer ordem constitucional de liberdade de expressão e barricaram-se numa praça. Eram 8 da noite, CC estava sob pressão das massas. Os amplificadores estavam se afogando na urina e na cerveja que vinham da trincheira. A emoção evaporou na pele dos participantes e a resignação ficou cada vez mais evidente. Alguns retiraram-se para os bares mais próximos, outros decidiram agir.

C.C interveio na violência e foi feito prisioneiro por apoiadores. Algumas noites depois, ele me confessaria que entre a praça e o local para onde foi levado se ouvia uma frase: “você já estragou tudo”.

Sentados a uma mesa estilhaçada, C.C chegou a um acordo: “transformar o evento numa manifestação cultural do partido político, mas deixá-los brincar”. Então os primeiros a sorrir foram os que tinham os chapéus mais largos, mas não foi só isso. Um papel caiu em suas mãos, com um pedido de inclusão “voluntária” no partido.

“Só assim saberiam que eu não ia reprová-los, já tinham o meu nome, o meu documento de identificação e também a minha assinatura. O show acabou, mas eles me ferraram”, disse C.C na noite seguinte.

Depois desse evento, as apresentações subsequentes tiveram pequenos problemas: policiais ou fanáticos religiosos jogando água no mosh.

Mas esta data foi diferente:

Havia uma organização de entrada (abrupta, mas organizada), um espaço onde se podia comprar bebidas (caro, mas eficiente), um banheiro, alguma tentativa de engenheiro de som, algumas cadeiras para as bandas com seus convidados e uma mesa estática, mas público presente. .

Por isso recordo com alguma simpatia aquelas noites viscerais, e divirto-me pensando que talvez o fim de Noise and Destroy não seja mais do que o amadurecimento de quem o organizou.

A certa altura, o descontrole e o pânico nos deixaram cansados.
O resto foi apenas uma anedota.

Taro K. Zelada
Lima, Perú.

 

Facebook - Comente, participe. Lembre-se você é responsável pelo que diz.