SENDO FOGO 

Banda de Hardcore punk da periferia de São Paulo com influências de Thrashcore e letras com forte temática social. 

SENDO FOGO
SENDO FOGO
  • Como surgiu o Sendo Fogo?

Robinho: Antes de mais nada, muito obrigado pelo convite para essa entrevista, é muito importante pra gente, de verdade. Bom, sobre como o Sendo Fogo nasceu. Nós três somos amigos de algum tempo já, talvez mais de quinze anos e nunca tínhamos tocado juntos. Aí o Diogo deu a ideia e eu sugeri que o Alemão tocasse bateria. A gente tentou pensar se seria legal fazer algum outro estilo, mas acabamos tocando um som que a gente já tinha certeza que se daria bem fazendo junto.

  • Já que falamos com uma banda de Hardcorepunk, nos passe a visão de vocês sobre o que vivemos hoje?

Robinho: Caos mental geral, pra resumir numa frase do Cólera! Bom, tem tanta coisa rolando, mas acredito que a gente vive hoje a ascensão de um neofascismo né, isso é inevitável de focar. É algo que tem acontecido no mundo inteiro e o mais curioso é ver crescer nas pessoas um instinto conservador tão pesado, sabe? É uma confusão porque existe ainda um fla flu político e isso é a pior coisa que pode acontecer numa democracia. Quando o outro é só o inimigo qualquer faísca acaba em guerra.

O presidente brasileiro é a pior piada que já existiu e olha que estamos falando do país que tem o Tiririca como deputado federal.

Ao mesmo tempo, hoje a gente vê uma esquerda não só acuada, mas que atua só rebatendo as pautas da direita, o que é péssimo do ponto de vista da ação direta, da esquerda voltando a se tornar uma forma de pensamento expressiva e popular. Falta começar a ser protagonista da porra do debate e não só um contestador das merdas que vem desse lado fascista imbecilizador.

  • SENDO FOGO 2
    SENDO FOGO 2

    Já sofreram algum tipo de “repressão”  pela galera da oposição ?

Robinho: Não. O máximo que aconteceu é o contato com essa galera que se diz “de centro” que não apóia nem esquerda nem direita (e a gente sabe bem pra que lado pende essa galera, né). Acho um marco importante do hardcore punk foi aquele evento Hardcore contra o fascismo. Nós não fomos convidados, mas vimos muitos de nossos amigos tocando, ajudamos compartilhando as publicações e indo nas edições. Naquele evento, a gente viu se levantar uma bandeira como nunca antes tinha acontecido. Por isso talvez ainda existisse tanto moleque ouvindo Dead Fish mesmo tendo umas ideias conservadoras e toscas. Acredito que ali afastou muita gente dessa cena, mas positivamente falando. Se alguém que tinha um pensamento meio babaca continuou na cena, passou a pensar diferente a partir dali.

  • Oque acham das bandas de rock, metal e etc. que hoje defendem o lado conservador?

Robinho: Bando de idiotas. O que eu falei do hardcore punk na pergunta anterior meio que completa isso. A cena do rock não tem nada que seja tão político como o punk. Então sim, quando você entra nessa, você está mais exposto e disposto aos pensamentos políticos, a ler material independente, consumir contracultura ali na fonte. Mesmo gente que estava no Hangar 110 em 2005 acaba tendo mais acesso às mídias independentes, aos discursos mais políticos e tal. O rock de maneira mais ampla e o metal tem uma lógica muito mais de sucesso e mercado do que o punk. Aquele afastamento entre o público e a banda. Acredito inclusive que isso distancie as pessoas do pensamento progressistas e crie a ideia tola de que não se pode misturar música e política.

  • O EP Sobreviver e Lutar lançado em 2018, aos que não ouviram ainda e pra quem esta conhecendo a banda agora, oque podem esperar?

Robinho: Podem esperar os 15 minutos de pancadaria e ideias de alguém que é de esquerda desde que começou a pensar na vida hahah. Acho que foi a primeira vez que fiz um disco que não paro de ouvir, não sinto vergonha, nem me cobro tanto. Pode ser coisa da idade também, quando a gente é mais novo a gente acaba se cobrando demais e muitas vezes deixando as coisas morrerem sem nem tentar. Então esperem músicas rápidas o suficiente pra não dar nem tempo de digerir direito. Aí você coloca o play de novo, recomendo.

  • Quem escreve as letras do Sendo Fogo?

Robinho: Quem escreve as letras sou eu mesmo. Na verdade, eu sempre escrevi as letras das bandas que toquei. E como eu toco guitarra, monto as bases já pensando em como vou cantar, pra mim é mais fácil escrever as letras também. Eu tenho uns cadernos riscados, blocos de notas cheios de ideias e depois vou encaixando nas músicas. É um exercício quase como montar um quebra-cabeças. Não dá pra ler ou consumir o noticiário sem parar pra escrever mil reflexões sobre a merda em que o país e o mundo se enfiaram. Uma coisa que eu fiz no EP foi mandar as letras pra amigos próximos antes de gravar. Não sei se é uma validação, é mais pela certeza de não estar falando uma merda muito grande hahah.

  • Também em 2018 vocês gravaram o clipe ASSASSINOS, nos conte um pouco sobre a ideia desse som e gravação do clipe.

Robinho: Esse som fala do genocídio preto no Brasil. A ideia desse som é que as pessoas reflitam um pouco melhor sobre a condição das pessoas pretas no Brasil. Porque a história ensina a gente de um jeito que faz parecer que a escravidão acabou mais de mil anos atrás, mas não faz nem 150 anos que ela acabou por aqui. Então sim, a gente ainda sofre com essa merda, a gente vive a vida inteira com um estigma  de ser inferior pra muitas pessoas que herdaram o racismo. A gente vive com um alvo nas costas para uma polícia extremamente treinada pra te olhar como um inimigo. A letra de “Assassinos” fala sobre isso.

O primeiro clipe a gente gravou com a ajuda do Regino Jr., um amigo nosso que fez as imagens ao vivo em um show no Comando Underground, um bar que já fechou, mas era um dos pólos mais importantes para as bandas independentes da quebrada, do Capão Redondo.

Já o segundo clipe foi feito pelo meu irmão Rodrigo Herzog, jornalista, que captou imagens de diversas matérias impactantes e trágicas pra gente que mora na quebrada, montou um roteiro e editou meio que sem a gente saber. E fiquei feliz demais com o resultado, porque a música era sobre exatamente o que ele ilustrou ali.

  • Principais influencias do Sendo Fogo?

Robinho: Acho que Discarga e Infect são as influências mais óbvias quando se ouve o Sendo Fogo. São bandas que a gente ama até hoje. Inclusive o nome da banda é emprestado da primeira demo do Infect, uma forma da gente homenagear essa banda, essa época tão importante nas nossas vidas nessa cena. Mas nessa lista entra muita coisa, Manliftingbanner, Betercore, Limp Wrist, Seein Red, Cólera, um monte de coisa.

  • O Sendo Fogo é composta por integrantes do Discurso de Pobre (DDP), é fácil consolidar duas bandas?

Robinho: Na verdade, o baixista e o baterista tocam no DDP. É como se nós fôssemos todos da mesma família, mesma galera, sabe. Então não é nada difícil conciliar, mesmo porque como o cenário das duas bandas é basicamente o mesmo (a música extrema), então muitas vezes somos convidados juntos. O Sendo Fogo começou na época em que nasceu a filha do Rafa, vocal do DDP, então ele ficou um tempo afastado. Mas logo que ele voltou a participar dos shows as coisas fluíram tranquilamente pras duas bandas. Até porque como o baterista é o mesmo, a gente reduz bastante o tempo pra arrumar o palco, essas coisas.

SENDO FOGO
SENDO FOGO
  • Quarenta oque atrasou e teve algo que de certa forma adiantou sobre os projetos da banda?

Robinho: Bom, esse ano a gente tinha um split que estava em pré-produção e tínhamos combinado de gravar no final de abril, então acabamos cancelando. O que no fim das contas foi até bom, porque permitiu que outras ideias chegassem e a gente somasse esforços pra desenvolver outros projetos. Então esse split agora vai se transformar em outras ideias mais coletivas ainda, por exemplo.

  • Tem projetos para este ano ainda, quando podemos esperar mais lançamentos de vocês?

Robinho: Completando o que falei acima, o split que estávamos planejando seria com o Utsu, banda de grindcore do RJ, mas agora estamos conversando com outras bandas de amigos para produzir um 4-way. Um outro projeto que entramos é num split com o pessoal do Punho de Mahin, produzido pelo Kleber do Estúdio Primeiro Andar, um camarada de muito tempo com o qual inclusive toquei junto num projeto chamado Condenados da Terra, em 2013. Esse split ainda tá no campo das ideias, mas se tudo der certo gravaremos muito em breve.

  • Sabemos que infelizmente muitas casas que fortaleciam o underground fecharam como acham que será o retorno pós-pandemia?

Robinho: Um dia desses fizemos um videochat com nossos amigos do PMA Trio e o Ritchie disse algo que marcou bastante pra mim: a gente vai precisar organizar show pra caramba pra manter essa cena de pé. Acho que mais do que querer tocar, é nossa responsabilidade fazer esses eventos pra manter as casas e estúdios em geral ativos. A gente sabe que não está fácil pra quem praticamente vive da aglomeração de pessoas como essas casas. Eu vejo muita gente por aí tranquila porque tem uma banda e não depende dela pra viver, com um pensamento de “está tudo bem, nós vamos continuar”. Mas você vai tocar onde se estiver tudo fechado? A gente precisa começar a pensar no ecossistema da cena independente, não só no nosso mundinho e na nossa banda. É um tremendo exercício sobre privilégio e empatia aí na nossa cara, exigindo que a gente pense um pouco mais além do nosso umbigo.

  • SENDO FOGO
    SENDO FOGO

    Em época de LIVES já pensaram em fazer algo pra galera que está com saudades dos shows?

Robinho: Logo que a quarentena começou a nos deixar com saudade da banda, a gente postou um playthrough de uma música nossa chamada Bombas nas ruas, cada um tocando da sua casa. Isso, claro foi tipo o estopim de uma pancada de ideias, especialmente pra mim, que peguei esse período pra me dedicar a estudar mais sobre áudio. Logo depois, pensamos em gravar músicas de bandas de amigos nossos numa série que eu chamei de Quarentena Punx que foi feita à distância inclusive com participações de outros camaradas cantando algumas músicas também. Está rolando no Instagram e no nosso canal do YouTube.

  • Plataformas digitais, vocês tem um bom retorno em divulgação, acham que a galera fortalece e acompanha mesmo? Aproveitando nos informem onde achamos material de vocês.

Robinho: Bom, as pessoas acompanham sim. Nosso disco tem bastante plays no Spotify e Bandcamp, inclusive teve uma galera que ajudou contribuindo com pequenas quantias que já são muito importantes pra gente. Nós divulgamos bastante no final de 2018 logo que o EP saiu e durante 2019, então a aceitação foi bem bacana. No YouTube, apesar de várias contradições na política feita para os criadores de conteúdo, a gente ainda publica algumas coisas, vídeos de rolês nos quais tocamos, alguns full concerts e agora esta série de vídeos à distância.

Spotify
https://open.spotify.com/artist/76ogioZ3JUT5SYVLwkGOkf?si=JwvC-pEvSrKlzbWlPYJ4gA

Instagram
https://www.instagram.com/sendofogo/

Bandcamp
https://sendofogo.bandcamp.com/

YouTube

  • Deixem uma mensagem final a todos …

Robinho: Muito obrigado a todos que leram até o final, às pessoas que nos apoiam em todos os níveis, desde comprando merch até compartilhando nossos sons por aí.

Espero que todxs estejam bem e se mantenham tomando todos os cuidados possíveis. É bom lembrar que ainda estamos numa quarentena rígida e ainda não é o momento de sair pra vida normal. E, na moral, a gente vai demorar pra ter essa certeza. Então mantenham a mente ativa da melhor forma que puderem, em casa. Vamos fazer de tudo pra isso dar certo e espero que esse tempo nos ajude a refletir sobre como viver num mundo melhor.

Acho que é isso. No mais, fogo nos racistas.

 

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