“Ymir pai de todos

Saudações ao glorioso Ymir, pai e mãe de todo reino habitado.
No vazio o primeiro a emergir, oh gigante enevoado.
Fonte de toda vida e soberano de outrora.
Pelos seus foi preterida, oh senhor e senhora.

Os filhos daqueles que da tua axila nasceram.
E que graças a ti oh Ymir, viveram e cresceram.
Depois de eras enfadados de viver vazio.
Tramaram seu fim, de sobremodo ardil.

Um mau necessário, bradaram então Vili, Ve e Odin.
Derramando teu sangue cinza e azul, não carmesim.
De ti vieram os desfiladeiros, o céu e as montanhas.
Até às areias das praias vieram de suas entranhas.

Vastas e nunerosas são as obras que do senhor se originaram.
De gigantes a anões, de vanir a aesir, de ti se formaram.
Até Audhumbla o nutriu de ti mesmo.
Lambendo teu gelo, que brotara a esmo.

De teu cérebro foram criadas as nuvens que regam a terra.
E mesmo sendo assassinado nos nutre desde a primeira era.
Antítese da ordem, sendo o senhor o próprio caos.
Fonte da magia do mundo, usada pelos bons e pelos maus.

Quero lhe dizer que muito o vanglorio.
Por ter se dado por nós, no primeiro vazio.
Certo estou que podias os aesir revidar.
Mas deixou-se morrer, para nos glorificar.”

Autor: Stayler Lima

 

 

Saímos das concepções ocidentais-cristãs, mas elas não saem de nós. Fica enraizado, pelo resto das nossas vidas, mesmo depois de termos abandonados tais conceitos e filosofias, mesmo que involuntariamente.

Nas últimas semanas, foi finalmente lançada uma série na Netflix que a muito era aguardada: “Ragnarok”.
Uma adaptação dos mitos e da fé nórdica aplicada aos dias de hoje, teoricamente num futuro após o Crepúsculo dos Deuses, se tivesse já ocorrido.

Na série deuses e gigantes se enfrentam, disfarçados como pessoas “normais” numa fictícia cidade chamada de “Edda”.

Vários debates surgiram. Um deles foi sobre os Jotuns, considerados inimigos dos deuses. Mas por conta disso, eles podem ser considerados “maus”? Devemos igualar eles a “demônios”, como pensam os cristãos?

 

No paganismo nórdico/germânico, eles são chamados de “Landvaettir”, ou seja, espíritos ancestrais da natureza. Recomenda-se sempre quando chegar em um local novo, que seja afastado da urbanização, deixar uma oferta para essas entidades antigas, pois muito provavelmente existem ali. Acreditamos que você criamos uma boa relação com eles assim. Não necessariamente devemos cultuá-los, como fazemos com os Aesir e Vanir, mas respeitar e mostrar essa reverência, pois são seres de grande imprevisibilidade. Eles representam o caos, assim como toda energia não organizada, o contrário dos deuses.

Se existe uma dicotomia, é justo essa: deuses a força organizada, a justiça. E os jotuns a força selvagem, indomável. E sim, uma precisa da outra e elas andam juntas. Os mitos sobre os casamentos de deuses com gigantas representam bem isso. Existem também diversos mitos de gigantes celebrando e colaborando com os deuses, como o mito de Aegir servindo os Aesires em seu salão. Indo mais a fundo, TODOS NÓS somos descendentes de gigantes, pois antes de Ask e Embla (os primeiros seres humanos), antes de Odin, existiu Ymir, o primeiro ser primordial do nosso universo, dos 9 mundos de Yggdrasil. O próprio Pai-de-todos, é MEIO JOTUN, pois seu pai Borr se casou com a gigante Bestla e o gerou, assim com o seus irmãos. Falando em irmãos, a mãe de Odin é irmã de Mimir, deus da sabedoria.

 

 

Existe também uma religião neopagã (assim como o Asatru e Odinismo) chamada Rokkatru, que foca o terceiro “panteão” nórdico.

Sim não existem muitos registros sobre o culto de gigantes, embora isso não quer dizer que tenha existido. Existem vários problemas nessa afirmação:

  • Muitos deuses que tem amplo material provando que foram bem cultuados, hoje em dia não são tanto, como Ullr, Njord, Nerthus, até mesmo Tyr.
  • Deuses que são consideravelmente bem citados, como Idunna e Loki, não foram achados vestígios algum de culto
  • Vanes de forma geral temos pouquíssimo material, e eles são mais antigos que os Asses. O mesmo acontece com os Jotuns.

 

Imagine querer controlar um maremoto, um furacão, uma nevasca. Apesar se serem forças destrutivas e fazerem o mal para as pessoas, muitas vezes é a própria natureza se defendendo de algo. São as leis da natureza. Não há como impedir ou controlar.

E de fato, na nossa fé, essas forças são vistas como vivas mesmo. Se leu Eddas, você percebe as analogias com elas. São simbólicas, não literais.

 

O que o poema de Stayler Lima nos mostra, é um outro lado e visão da coisa: o sagrado é muito mais complexo do que achamos. E podemos até chegar perto de saber toda a verdade sobre elas, mas nunca em sua totalidade. Não nessa forma, não aqui em Midgard. Talvez com nossos ancestrais, talvez navegando pela grande teia da Wyrd, enquanto encontramos nosso destino final.

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