“Fala-se incessantemente contra as paixões. Eles são considerados a fonte de todo mal humano, mas esquece-se que também são a fonte de todo prazer.

DENIS DIDEROT

 

O Centro de Lima, ao contrário do que se possa perceber, é a capital da boemia. Às 21h, alguém chegou antes de você para fumar, beber, comer ou vender. O passeio ao Machu Picchu Bar é identificado pelos 4 ou 5 semáforos que já fecharam para o feriado. Uma cerveja quente na mochila, uma conversa com um médico, a recepção dos motociclistas e suas camisas nuas; tudo, do lado de fora de algumas portas de metal com uma luz piscando dando as boas-vindas. Minutos antes de subir ao palco, REPTIL fala. São os motorizados que se perguntam “Por que diabos eles ainda estão vivos?”, mas têm a alma nas mãos frias para fazê-los falar. A experiência inunda o bar. Eu me viro, tento evitar o contato direto, aquele do olho no olho, aquele que gera medo.

Ritmos estranhos aos ouvidos em seu primeiro álbum, dão o pontapé inicial na apresentação. A segunda música não passou e o vocalista/baixista pede água, cerveja ou os dois. O grito lancinante ensurdece meu ego e não é mais possível retomá-lo. Uma mulher que não me conhece estende a mão, sopra fumaça grossa em mim e eu fumo com ela. De repente, uma onda de carne bate contra meus óculos. Fiquei cego, mas o solo de guitarra me obriga a parar, a me manter entre as câmeras, o baixo e o palco.

A primeira reunião acabou.

Eu me escondo no banheiro e tiro minha camisa. Deixei brilhar, sob o único foco branco do local; um colar de prata, um charuto quebrado e o suor do pano. Um homem iluminado, com todas as histórias que poderiam ser contadas entre suas tatuagens, pega meu braço e sacode minhas orelhas com uma oração… ele começou o mosh de SATÁNICOS MARIHUANOS.

Sob uma imponente lua cheia nos arredores deste recinto, ouvem-se os cânticos do abismo. A experiência é inevitável, quem decidisse aparecer seria tratado com o mesmo horror. O suor espirra no meu rosto, uma cotovelada bate no meu peito, um “com licença” e depois continuo morrendo. As mãos de fogo são levantadas, os blasfemadores se reúnem. O perigo faz parte do jogo e eu subo ao palco, enfrento o incômodo medo de destruir esse momento, mas não, consigo retratá-los em seu êxtase. Salto no vazio e dois estranhos me pegam nas mãos, que me devolvem ao canto onde pertenço. O mosh está ficando cada vez mais intenso. Agora sou minha câmera e o que vejo não são mais do que trilhas vibrantes se chocando, mulheres que curtem a alegria do inferno, homens que se abraçam para cantar um verso.

“Eu vi você. Você foi o quarto satânico, algo como o 4º beatle”, diz-me o baixista do “EL JEFAZO” referindo-se ao meu trabalho conturbado de documentar esta revelação.

Consideravelmente, o público diminui em massa. Eu me pergunto então, que material vou entregar? Pois bem, a banda a tocar foi a que me deu o rendimento, que agora é capaz de fazer explodir este sítio e dar-me o necessário para não cair nas minhas vontades e que as tristes tentativas se espatifem por terra. É assim que o homem iluminado, junto com o descalço; cometer o crime de usurpar o microfone. Entre as mãos derretidas, o receptor das lamentações expande o corpo principal deste encontro por toda a sala. Aquele corpo foi totalmente consumido, agora o homem descalço está nu, pegam minhas mãos e não posso mais fotografá-los, imponho resistência, mas outro sintoma é identificado: a busca pelo inimigo. E o inimigo toma a liberdade do sacrifício. Ele se imola diante dos fiéis e cai em seus braços. Ele é levado entre os cantos deste ringue, ele é levado com cuidado, ele é levado perante “EL JEFAZO”” e eles o devoraram.

       

  • 2h e 30h, o único lugar que não fecha.As criaturas se espalharam.

    A conexão terminou, é hora de voltar para casa intacta.

    Photos e review por : Taro K. Zelada

  • Lima, Perú.

Fotos do Festival aqui: 

 

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