O Under The Doom Festival não poderia ter regressado de melhor forma. No final primeiro dia de festival celebrámos os 35 anos dos Rotting Christ, recebidos com imenso carinho e admiração do público, do início ao fim do concerto. Era notória a expressão de felicidade em todos os membros da banda. Para nós, ansiosos por rever a lendária formação helénica, foi uma atuação arrebatadora, com alguns temas novos e uma excelente seleção de clássicos!Para além de Rotting Christ, na noite de sexta-feira actuaram os portugueses ANZV e os Process of Guilt, os franceses Seth, e os noruegueses Borknagar.
O segundo dia do festival foi, sem dúvida, o mais dedicado ao Doom. Um ambiente lúgubre, marcado por ritmos pesados e arrastados, criou uma atmosfera intensa e introspectiva. Embora o sol ainda estivesse alto, dentro do Music Station vivia-se a tarde mais negra e sombria de Lisboa. Aos poucos, a sala foi-se enchendo com um público composto, em grande parte, pela geração que viveu a sua juventude nos anos 90.
Os Music in Low Frequencies foram os primeiros a subir ao palco do Music Station, e fizeram-no de forma surpreendente. A poderosa voz de Mariana Faísca invadiu o espaço com “Web of Questions”, enquanto uma figura feminina era colocada numa estrutura no palco, para ser erguida mais tarde, criando um momento de grande impacto visual.
A cadência lenta e forte da bateria de Diogo Machado do Vale marcou o início de “This Corpse”. Ao som deste tema, a figura feminina foi erguida e mantida suspensa no centro do palco até ao final da atuação da banda bracarense. Com esta performance original, que simboliza a perfuração da carne, os Music in Low Frequencies recriaram no Under The Doom Festival uma parte do videoclipe do single de apresentação do álbum Catharsis, lançado em 2023.
Ao som dos riffs pesadamente melancólicos de Sérgio Ferreira, chegou “Unconsciousness”, onde a voz limpa de Mariana Faísca brilhou no início do tema. “Starving the Weak” encerrou a prestação dos Music in Low Frequencies, que demonstraram qualidade e originalidade. Um concerto que merecidamente recebeu muitos aplausos.
A riqueza atmosférica do doom metal melódico transformou o concerto dos chilenos Wooden Veins num dos momentos mais introspectivos e melancólicos desta edição do Under The Doom Festival.
Abriram e encerraram o concerto com faixas do primeiro álbum, In Finitude (lançado em 2021), nomeadamente “The Veiled Curse” e “Beyond Words”. Deste álbum interpretaram também “Empty Arcs”, onde os teclados de Eduardo Poblete criaram uma profunda melancolia, enquanto os riffs da guitarra de Juan Escobar intensificaram a atmosfera sombria.
“Tearing Sea” foi o segundo tema da tarde, pertencente ao mais recente álbum Imploding Waves, lançado em 2023. Javier Cerda (vocalista) e Pablo Tapia (baixista) destacaram-se pela sua grande expressividade em palco, dando uma intensa carga emocional à performance. Do mesmo álbum, interpretaram ainda “Skies”, “Vuelavá” e “Ganymede”. Na bateria, Alberto Atalah, com as suas batidas pesadas e espaçadas, contribuiu para a criação da atmosfera densa e carregada, tão característica do doom metal.
Carmelo Orlando, fundador e vocalista da banda italiana Novembre, destacou-se pela sua presença carismática em palco, criando uma conexão dinâmica e positiva com o público durante a atuação no Under The Doom Festival. Sempre comunicativo, Carmelo envolveu os fãs ao longo espectáculo.
O repertório incluiu faixas do último álbum Ursa (2016), como “Australis” e “Umana”, além de clássicos como “Everasia”, “My Starving Bambina” e “Love Story”. Perto do final, surpreenderam com um cover de “Rapture” dos Paradise Lost.
A versatilidade vocal de Carmelo brilhou, alternando entre tons melódicos e momentos mais agressivos. Misturando doom metal, death metal e rock progressivo, os Novembre realizaram uma performance intensa, refletindo a profundidade e complexidade da sua música, muito apreciada pelos presentes.
A banda irlandesa trouxe à oitava edição do Under The Doom Festival a profundidade do doom aliada à crueza do death metal. “The Sickness” de 2008 foi o primeiro tema. Os Mourning Beloveth criaram um clima obscuro, iluminação mínima e sonoridades pesadas. A seguir, tocaram “Old Rope” de 2013 e “I Saw a Dying Child in Your Arms” de 2005, intensificando ainda mais o ambiente depressivo.
A alternância entre a voz limpa Frank Brennan com a voz gutural de Darren Moore evidenciou a fusão perfeita entre os dois estilos de metal, bem presente em “Nothing Has a Centre” de 2013 tema escolhido para encerrar a actuação. Quatro músicas longas e intensas, interpretadas com total entrega e repletas de emoção, envolveram o Music Station na melancolia melódica do doom/death metal dos Mourning Beloveth.
Os Sinistro, banda lisboeta de doom metal com influências de post-metal e música atmosférica, chegou ao Under The Doom Festival repleta de novidades: o novo álbum Vértice, lançado no dia 4 deste mês; a nova vocalista, Priscila da Costa; e o novo baixista, Pedro do Vale. Com tantas novidades, a expectativa entre o público era perceptível nos momentos que antecederam o inicio do concerto.
Combinam uma estética visual impactante com uma sonoridade densa e emotiva, criando uma experiência intensa que transcende o som e envolve completamente o público. A voz de Priscila da Costa é poderosa e emotiva, com um toque a fado mas num estilo contemporâneo. Destaca-se pela profundidade e expressividade, contribuindo para a atmosfera sombria e envolvente que caracteriza o doom metal da banda.
Nesta performance intercalaram músicas de Vértice com músicas de Semente, editado em 2016: “Partida”, “Elegia”, “O Equivocado”, “Relíquia” e “Templo de Lágrimas”. Durante este último tema, a frase “em memória de: Jorge Correia, Vítor Lafaia e Mário Aires” apareceu no ecrã, provavelmente uma homenagem a três pessoas que tiveram um impacto importante na vida pessoal ou artística dos membros da banda.
Nota muito positiva também para o novo baixista Pedro do Vale, assim como para todos os restante elementos da banda. Um excelente concerto em português!
A banda Abyssic, formada por músicos experientes do cenário do metal extremo norueguês, trouxe a atmosfera mais intensa e profunda ao segundo dia do Under The Doom Festival. Envoltos numa penumbra de luz reduzida, decoraram o palco com velas, enquanto o aroma de incenso permeava o ambiente. Com vestes negras e capuzes, rostos pintados, criaram o cenário ideal para uma viagem sonora intensa, marcada pela complexidade de arranjos do seu doom/death metal enriquecido com orquestrações sinfónicas grandiosas.
A actuação dos Abyssic teve inicio com “Funeral Elegy”, tema do álbum A Winter’s Tale editado em 2016. Memnock (vocalista e contrabaixo) criou de imediato uma ligação com o público e esteve sempre muito comunicativo durante toda a performance. Do álbum mais recente Brought Forth in Iniquity, lançado em 2022, tocaram “Cold as Winter Storm”, “Mirror of Sorrow” e “Djevelens Lys”. Tivemos o privilégio de ouvir também um tema inédito.
As músicas de Abyssic, embora extensas, mantêm-se longe de qualquer monotonia, graças à incrível fusão entre o sinfónico e o doom/death. Passagens atmosféricas, intensamente orquestradas, combinadas com guturais profundos, riffs pesados, uma bateria arrebatadora, teclados e contrabaixo, conferem a cada tema uma dimensão épica, cativando o público por completo. Qualidade, experiência e técnica destacaram esta actuação como um dos pontos altos do segundo dia do festival!
Chegava o momento mais esperado por muitos nesta edição do Under The Doom Festival: o concerto dos icónicos Tiamat. A banda sueca, que iniciou a sua carreira em 1988 no death/doom metal e mais tarde evoluiu para o metal gótico, encerrou a oitava edição do festival com uma atuação especial e carregada de nostalgia.
Um concerto inteiramente dedicado a dois álbuns emblemáticos da carreira de Tiamat: Clouds de 1992 e Wildhoney de 1994, obras que assinalaram uma mudança no seu estilo e consolidaram a banda como pioneira do metal gótico/atmosférico na Europa. Para a geração que viveu a sua juventude nos anos 90, Clouds e Wildhoney foram álbuns marcantes, e esta performance de Tiamat foi um verdadeiro regresso ao passado. Uma experiência emocionalmente intensa e nostálgica para os fãs que vivenciaram a era em que estas músicas foram lançadas.
O concerto abriu com uma sequência inteiramente dedicada ao álbum Clouds com cinco temas consecutivos: “In a Dream”, “Clouds”, “Smell of Incense”, “A Caress of Stars”, e “Forever Burning Flames”. Estas músicas puseram literalmente o público em movimento, desencadeando os primeiros moshes e uma onda de headbanging enquanto ecoavam os refrões em uníssono com a banda.
No sexto tema, a atmosfera mudou para o universo mais progressivo e psicadélico, iniciado pela intro Wildhoney que antecedeu: “Whatever That Hurts”, “The Ar”, “Visionaire” e “Do You Dream of Me?”. A voz profunda e hipnótica de Johan Edlund, vocalista e principal compositor da banda, guiava o público numa experiência emocionalmente intensa, onde a melancolia do som atmosférico e o peso dos elementos progressivos se uniam em perfeita harmonia.
O set prosseguiu com “Mountain of Doom” (Clouds), “Divided” (Wildhoney) e “Vote For Love” (Wildhoney) antecedem a entrada em palco de Fernando Ribeiro. Johan Edlund chamou ao palco o vocalista dos Moonspell, que se juntou aos Tiamat para uma interpretação de “The Sleeping Beauty” (Clouds). No final da música Fernando Ribeiro expressou o quanto Tiamat influenciou Moonspell, uma das suas maiores inspirações, e agradeceu a oportunidade de participar neste momento especial.
A performance brilhante dos Tiamat neste regresso ao Under The Doom Festival culminou com “25th Floor” e “Gaia,” ambos do álbum Wildhoney. Um concerto envolvente e memorável!
São eventos como este que mantêm vivo o Underground, obrigada ao Music Station por nos receber e principalmente por ter nascido este ano mais uma sala de espectáculos em Lisboa.
O nosso sincero agradecimento à NotreDame Productions pela oportunidade de vivenciar e relatar o segundo dia deste evento. Parabéns pela excelente seleção de bandas nacionais e internacionais de alta qualidade, que compuseram o cartaz da oitava edição do Under The Doom Festival, um regresso em grande! Foi uma experiência repleta de momentos e emoções que certamente permanecerão na memória de todos os presentes.